FÓSSEIS ROSAS PROFANADAS
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O ar raspando o sangue seco da alma.
Alma mutilada a minha.
Sangue incrustado em suas paredes desde a infância, algumas feridas já cicatrizadas.
Minha alma um painel de Pollock.
Nas partes não cicatrizadas a tinta escorria espessa.
Por muitas noites eu não dormia.
A cor que mais doía era o amarelo aflito, aquele amarelo gritante.
Não sei se algum dia vai esgotar o amarelo de Van Gogh.
Como se ele tivesse a chave secreta da desesperança, em forma de girassol.
O meu interior borrado, sangrado de cores ardia ao vento, o pulmão ardia ao respirar lufadas de ar puro entre medo e delírio.
Raul segue pela Estrada Graciosa, um caminho antigo calçado de pedras, onde abismos se abrem, onde um trem trafega, onde pássaros desnudam suas lágrimas.
Quatro passos necessários para aprumar o esqueleto.
As nuvens se ordenam atrás das bananeiras.
Olho o bangalô e sinto uma ternura de gênesis.
Projeto de éden, recanto de Nyx.
À entrada da varanda um tapete tecido em barbante azul cobalto.
As pedras da entrada são claras, justapostas formam um desenho branco assimétrico.
A varanda pequena adornada de bebedouros ao redor onde um beija-flor pousa, beija a água adocicada e se vai.
Uma rede da cor do trigo maduro.
Raul bate na porta, três toques, a porta está entreaberta.
Ela não está na casa, eu penso.
Silenciosa como um anjo, pousa das alturas ao nosso lado.
fragmento do romance - Constelação de Ossos - Bárbara Lia, 2009